quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Sudão do Sul: A Gênese do Novo Estado Africano e as Implicações Jurídicas Imediatas


Rodrigo Freitas Palma[1]




                             A história do Sudão, em muitos aspectos, segue na esteira da trágica realidade enfrentada por alguns de seus principais vizinhos africanos. Aqui, mais uma vez, têm imperado o fatídico trinômio “guerra, peste e fome”, sempre, é claro, em proporções bíblicas. Entre os anos de 1983 e 2005 o país foi devastado por mais um conflito fratricida que renderia, depois de exauridas as forças dos beligerantes, na assinatura de um acordo de paz – o “Tratado de Naivasha”, mais conhecido como Comprehensive Peace Agreement for Sudan (CPA).
                            Importante ressaltar é que o referido pacto abriu caminho para a secessão da região setentrional do Estado, onde a população professa o cristianismo ou é adepta de religiões e credos de origem politeísta. As tensões com a maioria muçulmana do Norte renderam a morte de milhares de seres humanos. Uma estrita observância à Sharia, a Lei Islâmica, sempre foi imposta aos cidadãos de forma ortodoxa e as demais manifestações religiosas fundadas em outras confissões eram vistas com o mais absoluto desprezo por parcela considerável dos sudaneses maometanos. Não são poucas as notícias sobre massacres de civis no território de Darfur. Estas pessoas são cotidianamente mortas em função de sua fé e diferenças culturais e étnicas. Nesse ínterim, clérigos percorrem o globo denunciando os horrores que lá tiveram lugar. O que mais causa assombro a todos os que tomam contato com estas informações são os recorrentes relatos da prática de crucificação em pleno século XXI, a atroz pena imposta de forma jocosa àqueles que, nas longínquas aldeias de um mundo esquecido pelo Ocidente, se declaram abertamente cristãos. As entidades de defesa dos direitos humanos há muito clamam pelo socorro ao Sudão e requerem maior atenção dos organismos internacionais, mas pode-se dizer que, até o presente momento, todas as iniciativas motivadas pelos morticínios tornaram-se inócuas. Mas sejamos um pouco mais otimistas no que concerne ao assunto. É bem verdade que o mais novo país a alcançar sua independência, o “Sudão do Sul” (Southern Sudan) já nasce com desafios gigantescos, que somente serão superados com décadas de esforço e rigorosa atenção da sociedade internacional à esquecida região, a fim de que sejam evitados novos dramas desta mesma natureza.
                            Entretanto, se um primeiro passo para a paz se fazia absolutamente necessário, este ocorreu na data de 30 de julho de 2010. Igualmente, vale notar que do ponto de vista legal, sabe-se que o Tribunal Penal Internacional expediu um mandado de prisão para o Presidente (do “Sudão do Norte”) Omar Al Bashir, acusado de ter cometido crimes contra a humanidade e quiçá, também genocídio. O novo país aparece no mapa com uma infra-estrutura de serviços não propriamente “precária”, mas antes, praticamente inexistente: faltam estradas, água potável, escolas e cidades habitáveis, pois não se sabe ao certo onde será a capital, posto que Juba, a maior localidade da região (que conta aproximadamente com pouco mais de 250.000 pessoas), não possui sequer asfalto e as poucas rodovias que ligavam a região a outros países ainda se encontram minadas[2].  Agora, com um governo soberano, poderão ser criados os mecanismos licitatórios que viabilizarão a participação de empresas diversas para trabalharem em prol da construção da jovem nação. Também as fronteiras com o país co-irmão não estão ainda definidas, o que ensejará, a partir de agora, maior vigilância das missões de paz da ONU.
                             Enfim, espera-se que agora os chamados “sudaneses do sul” alcancem os objetivos consignados em seu brasão nacional:


[1] Rodrigo Freitas Palma é Advogado; Especialista em Relações Internacionais; Especialista em Direito Militar e Mestre em Ciências da Religião. Em Brasília é Professor de Direito. Artigo composto em razão da entrevista que foi concedida à Rádio Nacional de Brasília, na manhã do dia 13 de Julho de 2011. Este artigo é dedicado à memória de todos os que foram massacrados no Sudão e tiveram suas vozes sufocadas pelo horror da guerra, fome e perseguição religiosa.
[2] Enquanto censos ainda não são realizados faltam inda faltam estimativas mais precisas.

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