quinta-feira, 1 de março de 2012

A Lei da Guayabera

Rodrigo Freitas Palma

                                  A famosa “guayabera” é uma tradicional camisa de mangas longas feitas de algodão ou linho usada há séculos pelo povo cubano. Seu estilo todo peculiar, com quatro grandes bolsos, parece combinar enormemente com o trabalho nos campos e as altas temperaturas experimentadas durante o ano inteiro na tropical ilha caribenha. O padrão estabelecido pelo costume local insiste que a vestimenta seja utilizada de forma devida, ou seja, sempre para “fora das calças”.
Raul Castro (à esq.) aparece com uma guayabera, ao lado do vice-presidente Jose Ramon Machado Ventura
                                                                    Foto de Javier Galeano/AP - 1.mai.10
                                                     Fonte: www1.folha.uol.com.br/mundo/810802-cuba

                                Ora, esta curiosidade tinha tudo para passar despercebida para a comunidade internacional. Entretanto, logo no início do mês de Outubro e 2010, eis que Raúl Castro apela para o império da lei para oficializar a dita roupa no universo das relações exteriores. Aboliu-se, deste modo, o conhecido traje verde-oliva eternizado por Fidel. Segundo a visão “progressista” do novo ditador cubano, a camisa é uma espécie de “símbolo” do patriotismo nacional e da “resistência ao domínio estrangeiro”. Por isso mesmo, a partir de agora, todo e qualquer diplomata cubano, em razão do imperativo legal, deverá comparecer a quaisquer conferências internacionais ostentando orgulhosamente uma “guayabera” na cor branca combinada com calças azuis. Ah! Já ia me esquecendo: às mulheres é lícito fazer uso de pequenas variações no tocante às cores. Nada mais surreal.
                                Sabe-se que durante os anos pós-revolucionários, a ditadura de Fidel somente conseguiu se celebrizar pelo mais absoluto desrespeito aos direitos humanos. Como de praxe, perseguiu e calou opositores e se assenhoreou dos meios de comunicação até alcançar a “unanimidade” que caracteriza os desvarios daqueles que são amantes do poder. E os insatisfeitos? Que se retirem. E de fato eles se retiraram aos milhares para a Flórida, onde foram recebidos de braços abertos. Outros tantos menos afortunados continuam tentando. E clamam aos céus para que suas pequenas embarcações, não raro fragilizadas pelas enormes ondas que apontam no horizonte do famigerado “Triângulo das Bermudas”, consigam, enfim, chegar ao destino tão sonhado.
                               É fato que a iniciativa tomada por Raúl Castro, incrivelmente festejada por alguns saudosos líderes latino-americanos, apenas reflete a deplorável condição de decadência das instituições de Cuba, as quais, como tudo mais, encontram-se falidas há muito tempo.
                              No contexto em questão, leis esdrúxulas como a da “guayabera” servem apenas para traduzir o tremendo descaso das duas únicas e absolutas “autoridades” do país – os irmãos Castro - por uma população sofrida, que não possui acesso aos bens e serviços essenciais a uma existência verdadeiramente digna. Aliás, decorridos cinqüenta anos, estas gerações nem mais sabem que a única função a que se presta qualquer Estado consiste na realização do bem-estar social.
                               Como não poderia ser diferente, Hugo Chavez, orgulhoso de suas “guayaberas” multicores [especialmente a vermelha], não perdeu a oportunidade para reverenciar publicamente Fidel Castro, seu ícone. Lula, por sua vez, mais conservador e menos afeito a variações, apesar de igualmente saudoso, foi mais fiel ao figurino. Vestiu uma “guayabera” branca ao lado de Raúl e aguardou os flashes. Se a moda pega....
Rodrigo Freitas Palma é especialista em Relações Internacionais e professor de Direito em Brasília.

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